A falta de oportunidade é um dos principais fatores no sertão Nordestino
- Adriano Mendes
- 6 de jan. de 2019
- 6 min de leitura
Atualizado: 7 de jan. de 2019
a fazer com que a sua população deixe suas casas em busca de oportunidades em outras regiões.
Segundo o Secretário de governo e controle interno da cidade de Manari, interior de Pernambuco, Lucas Bezerra Freire 16% de toda a população do Município imigram para outros estados como, por exemplo, São Paulo em busca de oportunidade. Vale lembrar que no ano de 2003 a cidade foi considerada a pior do país para se viver.

Entre esta taxa apresentada pelo secretário, eu me incluo nela, pois foi aos meus 12 anos de idade que eu tive que deixar minha família no interior de Pernambuco para morar em São Paulo. Naquele momento não tive outra escolha, pois o que estava a decidir era o meu futuro. Morar no Sertão é viver um futuro incerto, é saber que o amanhã é preocupante sem saber o que vamos comer. A única escola da região ficava muito longe de casa, então tínhamos que caminhar horas e horas debaixo de um sol de 40ºc até a escola mais próxima, já cansado sem muito interesse em assistir aula, já me perguntava na volta pra casa, a escola não tinha carteira para todos, então muitos sentavam no chão sujo, em meios aos dejetos de pássaros e quando falávamos em ir ao banheiro, também era algo complicado, porque não tinha banheiro, era preciso fazer nossas necessidades dentro do mato, nem mesmo a merenda vinha para a escola era muito raro quando vinha alimentos para os alunos. A seca é um grande desafio para todos, e todo ano temos que nos preparar para passar por isso. Ela nos maltrata muito, choramos com a simples vontade de ter apenas água, para o nosso uso do dia a dia e nem sempre temos. Já passei horas e horas depois de ter cavado um buraco no chão, esperando para ver ser dava água. Quantas brigas já pude vivenciar por simplesmente não ter água. O nordeste é castigado pela pobreza pelo esquecimento dos poderosos que governam o nosso país.
A realidade de quem vive da roça é contraditória de tudo aquilo que assistimos só pela TV. Morar nesses lugarejos nos proporciona certa limitação, não temos acesso a telefone, a comunicação é através de cartas, ou pessoalmente. Lembro como hoje que no ano de 2007 não tínhamos energia elétrica, então tudo era através do candeeiro (lamparina movida a gás), foi por um desses motivos que eu tive que sair de casa para tentar realizar um sonho que era estudar e ter um futuro diferente de meus pais.

Marycélia Santos também veio do agreste para São Paulo para tentar sua vida aqui, ela nos conta agora um pouquinho de sua trajetória de vida: ‘’Consegui concluir o ensino médio aos 16 anos, confesso que não foi nada fácil, eu morava no sítio e estudava na cidade. Em busca de trabalho e mais facilidade para fazer um curso, fui para São Paulo em janeiro de 2013, mesmo meus pais não gostando da ideia, eu decidi viajar (...). Trabalho como babá no mesmo lugar desde que cheguei na cidade e também como doméstica e não tenho vergonha disso. Já vai completar seis anos que sai da minha terra natal. Ainda pretendo cursar uma faculdade, o importante é não desanimar”, diz Marycélia. Assim como eu, a Marycélia também veio de uma realidade difícil, então para cada um de nós que vivemos diante de um lugar onde não temos o básico para se viver, como por exemplo, a falta de água encanada, sem esgoto e gás. . Muitas crianças que vivem no agreste pernambucano tem um futuro duvidoso pois vivem somente da roça e muitas quando completam 14 anos, casam e constroem uma família. Geralmente as adolescentes desta região se casam até os 20 anos.

A professora Sônia Aparecida de Brito que vive em São Paulo, nos mostra um conhecimento mais amplo entre o sudeste e o nordeste. Filha de nordestinos lecionou em São Paulo até se aposentar. Em sua trajetória, fez inúmeras viagens à Pernambuco e diversas regiões do agreste nordestino. Ela diz sobre a dificuldade que os alunos nordestinos enfrentam para estudar por conta das condições precárias que vivem e a falta de fiscalização nos transportes escolares, que deveriam levar as crianças com segurança para a escola, e lugares de extrema pobreza: “Em algumas viagens ao nordeste, pude me deparar, com lugarejos extremamente desprovidos de quaisquer condições de se viver! Casas de barro, sem água encanada, sem esgoto, sem gás, sem energia elétrica, situações precárias de sobrevivência. Os alunos têm que sujeitar a andar por horas, debaixo de Sol escaldante, dependendo do lugar, existe um sistema de condução, bem precário, que se houvesse fiscalização rodoviária, alguns desses veículos não receberiam autorização para circular (...). Muitas dessas crianças, às vezes, só conseguem o mínimo, pois, quando vão se dar conta, que o estudo é necessário para a vida, já se encontram adultos. Embora, nunca é tarde para recomeçar!”, relata Sonia. Em meio a tantos desafios o nordeste é rico em sua cultura popular, quando falamos em turismo, é no nordeste que está acentuado o destaque nos destinos mais procurados para passar as férias. Temos grandes legados de escritores e poetas de nomes consagrados como João Cabral de Melo Neto, uma figura entre os principais poetas da língua portuguesa de todos os tempos, entre os mais importantes do Brasil. Mesmo com estes nomes consagrados, o sertão ainda precisa ser visto. Os governantes precisam enxergar além das capitais, tem que ir a fundo, pois no agreste existem pessoas com sonhos e vontade de participar da história do nosso país. Tenho orgulho de ser filho de agricultores, que não tem o conhecimento da leitura e da escrita, meus pais sempre falaram da importância da escola para nós, infelizmente meus irmãos não são alfabetizados, isso é muito triste, mas para mim também não foi fácil, entre muitos desafios e perseverança. Hoje estou prestes a me formar no ensino superior.

DEPOIMENTO DA MARYCÉLIA ‘’Sou alagoana; nasci em uma pequena cidade do interior que se chama Mata Grande, tenho 24 anos, meus pais também são nascidos e criados lá, vim para São Paulo quando tinha 18 anos em busca de novas oportunidades.
Sempre fui objetiva com aquilo que eu queria meus pais falam que sou uma garota esperta desde a minha infância, Não é à toa que no meu primeiro ano escolar com 5 anos eu já aprendi a ler, as minhas duas irmãs mais velhas já estudavam na época, infelizmente elas desistiram da escola. A mais velha casou aos 14 anos e parou de estudar na 6ª série; a outra também na 5ª série pois não conseguiu se alfabetizar o que é muito triste. Eu consegui concluir o ensino médio aos 16 anos, confesso que não foi nada fácil, eu morava no sítio e estudava na cidade, acordava às 05h00 da manhã e chegava em casa as 14h00 da tarde. O transporte escolar não passava próximo de casa, portanto eu tinha que andar 30 minutos à pé até conseguir pegá-lo e demorava em torno de uma hora e meia para chegar a escola, foi uma fase muito difícil mas não desisti. Quando voltava da escola ainda ia para a roça, cuidar dos animais, quando anoitecia eu fazia as lições e os trabalhos escolares. Meus pais são analfabetos, então todos os trabalhos escolares sempre fiz sozinha, e na minha casa não tinha eletricidade, quando eu fui para o ensino médio já havia colocado energia elétrica na região, o que facilitou muito a vida de todos. Formei em 2010 e como era um ano de seca e meu pai estava a trabalho no Rio de Janeiro, não pude participar do baile de formatura. Foi uma época que eu e minha mãe trabalhávamos duro para eu ter um futuro melhor, consegui fazer a colação de grau, com imensa vontade de entrar na faculdade, mas não acreditava que iria acontecer. Em busca de trabalho e mais facilidade para fazer um curso, fui para São Paulo em janeiro de 2013, mesmo meus pais não gostando da ideia ei decidi viajar. Ao chegar à cidade grande, consegui um emprego como babá, não era integral, somente algumas horas por dia com salário pago diariamente, no final de semana. Consegui outro trabalho intermediário para compensar a jornada. Morei com minha irmã por um tempo, depois fui para a casa de uma tia e hoje me estabilizei e moro sozinha e sou independente. Trabalho como babá no mesmo lugar desde que cheguei na cidade e também como doméstica e não tenho vergonha disso. Já vai completar 6 anos que que sai da minha terra natal. Aprendi muito com essa vinda a São Paulo, eu era uma pessoa muito tímida, conheci pessoas diferentes, sotaques diferentes sem deixar a minha essência de lado. Acredito que devemos nos arriscar e buscar aquilo que almejamos. Ainda pretendo cursar uma faculdade, o importante é não desanimar.”
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